quinta-feira, dezembro 07, 2006

continuação...não resisti

Não demorei a conhecer melhor essa flor.

O principezinho, que assistia ao despontar de um botão enorme, estava mesmo a ver que dali ia sair uma aparição miraculosa; mas a flor nunca mais acabava de se arranjar, de se pôr bonita, sempre trancada naquele quarto verde…só queria aparecer no máximo esplendor da sua beleza. Ih sim! Ela era mesmo muito vaidosa!..
- Mas que flor tão bonita!
- Lá isso é verdade.. – respondeu ela, com uma voz muito suave. – E nasci com um sol…
O principezinho suspeitou logo que a modéstia não devia ser o seu forte; mas era tão enternecedora!

- Se os tigres julgam que me metem medo com aquelas garras..cá os espero!
- Mas no meu planeta não há tigres!...
- Dos tigres não tenho mesmo medo nenhum. Agora das correntes de ar…Não terá aí um biombo?

“Nunca lhe devia ter dado ouvidos. Nunca se deve dar ouvidos às flores. Deve-se é olhar para elas e cheirá-las. A minha perfumava-me o planeta todo, mas eu não sabia dar valor a isso. E aquela fanfarrice das garras, que me irritou tanto, devia era ter-me enternecido…”
“Não fui capaz de entender nada. Devia tê-la avaliado não pelas palavras e sim pelos actos. Ela perfumava-me e dava-me luz! Eu nunca devia ter fugido! Devia ter sido capaz de adivinhar toda a ternura escondida por detrás daquelas pobres manhas. As flores são contraditórias! Mas eu era novo de mais para saber gostar dela.”
Julgo que aproveitou uma migração de pássaros selvagens para fugir. No dia da partida, quis deixar tudo em ordem…
- Adeus – disse para a flor.
Mas ela não lhe respondeu.
- Adeus – repetiu o principezinho.
A flor tossiu. Mas não era por causa da constipação.
- Fui muito parva - acabou por dizer. – Desculpa. Tenta ser feliz.
Ficou espantado por ela não se pôr com recriminações…
- Porquê essa admiração? É óbvio que gosto de ti - disse a flor. Por culpa minha nunca o soubeste. Mas hoje isso já não tem importância nenhuma. Olha, tu também foste tão parvo com eu. Agora tenta ser feliz…E deixa essa redoma em paz. Não preciso dela.
- E o vento?
-Não estou tão constipada como isso… O fresco da noite só me pode fazer bem. Sou uma flor!
- E os bichos?
-Duas ou três lagartas terei mesmo de suportar para ficar a conhecer as borboletas. Dizem que são tão lindas! E que outras visitas hão-de aparecer por cá? Tu , tu hás-de estar longe. E os bichos maiores não tenho nada a temer. Afinal, de que quero eu as minha garras?
Mais uma vez exibia ingenuamente os quatro espinhos.
Depois, ainda disse:
- Não fiques para ai a empatar, que me irritas! Não resolveste ir embora? Pois então vai!...
Porque ela não queria que ele a visse a chorar. Era uma flor tão orgulhosa…”

in O Principezinho
Antoine De Daint-Exupéry